A nova série da Netflix, “Desobedientes”, se lança como uma narrativa que inicialmente parece convencional, mas rapidamente se transforma em uma experiência inquietante e disposta a desafiar as expectativas do gênero. Criada por Mae Martin, a produção funde drama psicológico, suspense e nuances de terror social, erguendo um ambiente opressivo na aparentemente tranquila cidade que abriga a Academia Tall Pines, um local que esconde segredos perturbadores. A premissa central acompanha adolescentes classificados como problemáticos, enviados para uma instituição que promete cura emocional, mas que gradualmente revela práticas muito mais sinistras por trás de sua fachada terapêutica.
O poder da série reside em sua capacidade de desarmar o espectador. O tom inicialmente naturalista e contido torna a progressão do controle e da manipulação ainda mais perturbadora. Mae Martin assina uma direção precisa e um texto que compreende como o poder se mascara de cuidado. Toni Collette, como Evelyn Wade, personifica essa autoridade carismática e quase messiânica, convertendo disciplina em culto e empatia em uma ferramenta de dominação.
A dinâmica entre as jovens Leila e Abbie, interpretadas por Alyvia Alyn Lind e Sydney Topliffe, funciona como o núcleo emocional da trama. Sua amizade simboliza a resistência frente à doutrinação de Tall Pines, enquanto a personagem de Martin, a policial Alex, investiga os eventos enquanto lida com traumas pessoais. Esta sobreposição de vulnerabilidades constrói uma narrativa densa e política, que questiona astutamente como o controle social pode se vestir de salvação.
A estética da série emprega uma paleta fria e silêncios prolongados como armas dramáticas eficazes. As paisagens idílicas do Canadá contrastam com o terror institucional, salientando que a ameaça frequentemente habita espaços iluminados por boas intenções. A montagem alterna sabiamente entre as perspectivas juvenis e a investigação policial, reforçando o tema central: a fragilidade da percepção individual quando a narrativa é controlada pelo poder.
Embora “Desobedientes” seja um acerto em ritmo e propósito, com uma crítica incômoda e direta a sistemas punitivos disfarçados de reabilitação, sua execução narrativa enfrenta obstáculos significativos. A série aborda temas cruciais como a saúde mental juvenil, relacionamentos familiares disfuncionais e os perigos de seitas, mas o roteiro não desenvolve plenamente seu potencial. A falta de coesão na estruturação de situações delicadas e a exploração superficial da relação entre a instituição e a cidade de Tall Pines são falhas perceptíveis. A narrativa também perde a oportunidade de explorar de forma mais profunda suas linhas paralelas, focando nos jovens dentro da academia e naqueles que conseguiram sair.
O elenco se destaca como um dos principais trunfos da produção. Toni Collette brilha ao explorar a dualidade de Evelyn, mesclando carisma e uma escuridão subjacente com maestria, ainda que a personagem não receba um desenvolvimento à altura de seu talento. Alyvia Alyn Lind e Sydney Topliffe demonstram química convincente e competência em cenas dramáticas intensas. Mae Martin traz uma presença mais contida, porém eficaz, como a investigadora cética, enquanto Sarah Gadon cumpre seu papel dentro das limitações do roteiro.
Infelizmente, os percalços narrativos culminam em um episódio final anticlimático e inconsistente. A tentativa de um desfecho impactante e imprevisível resulta em uma conclusão que parece vaga, com várias pontas soltas e um peso emocional insuficiente. No balanço final, “Desobedientes” é uma produção com uma premissa promissora e um elenco talentoso, mas que não consegue superar suas decisões narrativas questionáveis e a falta de um aprofundamento coeso, deixando a sensação de um produto aquém de seu potencial.
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