A cidade de Derry, Maine, mais uma vez abre seus portais sombrios para o público em “IT: Bem-Vindos a Derry”, série prequel da HBO que expande o universo criado por Stephen King. Desenvolvida pelo mesmo time dos filmes de sucesso, Andy e Barbara Muschietti com Jason Fuchs, a produção de oito episódios é uma experiência ao mesmo tempo assustadora, sanguinária e diabolicamente divertida, mas que frequentemente se apoia mais na nostalgia e no rehash do que em sustos genuinamente originais.
A narrativa principal se desenrola em 1962, uma década antes dos eventos do primeiro filme, apresentando um novo grupo de jovens destemidos que espelha a famosa Turma dos Perdedores. Este núcleo infantil, composto por personagens como Lilly, uma jovem com um passado conturbado no asylum Juniper Hill, e Ronnie, filha do projetista do cinema local, é um dos grandes acertos da série. Extremamente competente e carismático, esse grupo investiga os misteriosos desaparecimentos e voões que emanam dos esgotos, em tramas que lembram o melhor de “Stranger Things”, porém com uma dose generosa de sangue e traumas psicológicos. Sempre que a trama se concentra nesses jovens, a série ganha ritmo, charme e uma dose de humor ácido.

No entanto, a sensação de déjà vu é intensa. A prequel opta por replicar a estrutura central do livro e dos filmes, preenchendo as lacunas com dispositivos e clichês de terceira linha do universo King. A decisão de refazer a fórmula dos “Losers Club” em 1962, em vez de explorar os ricos flashbacks e interlúdios do livro, é peculiar e pode frustrar fãs mais puristas, especialmente aqueles apegados à linha do tempo original da obra. A série está mais interessada em espalhar referências e Easter eggs—como um ônibus da prisão de Shawshank ou menções à família Bowers—do que em cavar novos caminhos narrativos com a profundidade que o material merece.
O elenco adulto, embora talentoso, é subutilizado. A trama da Base Aérea, envolvendo o Major Leroy Hanlon e sua esposa Charlotte, introduz tensões raciais e da Guerra Fria, mas essas nuances frequentemente ficam em segundo plano, sem a profundidade necessária para transcender o simples cenário de horror. Entre os veteranos, Chris Chalk, como Dick Hallorann, é um destaque, trazendo uma gravidade haunting que ecoa seu destino no universo King. Já Bill Skarsgård, embora creditado e sempre assustador como Pennywise, tem uma presença mais espreitadora nos episódios iniciais, uma escolha narrativa que pode dividir, mas que evita a saturação do personagem.

Onde “Bem-Vindos a Derry” realmente brilha é em sua execução técnica e nas sequências de terror prático. O primeiro episódio é um espetáculo cinematográfico, abrindo com um prólogo deliciosamente gore que define o tom sanguinário. A série não economiza em cenas icônicas e perturbadoras, como uma sequência memoravelmente grotesca em um supermercado ou um pesadelo envolvendo olhos que vai aterrorizar os mais sensíveis. A direção, assinada por Muschietti e outros, cria momentos de puro horror visceral, embora occasionalmente o excesso de CGI estrague a imersão. A sequência de abertura, com a música “A Smile and a Ribbon” sobre imagens Rockwellianas corrompidas, é genial e aponta para uma sátira social que a série, infelizmente, não explora com a devida astúcia.

No fim, “IT: Bem-Vindos a Derry” é uma superprodução bem realizada, com valor de produção digno da HBO e um elenco sólido. Ela entrega exatamente o que promete: sustos competentes, muita violência e uma imersão nostálgica na cidade mais amaldiçoada de Stephen King. No entanto, a dependência excessiva de fórmulas consagradas e a relutância em se afastar do material familiar a impedem de ser uma obra truly aterrorizante. A série funciona melhor como um divertido, porém familiar, passeio de montanha-russa pelos becos de Derry, um lugar onde, como bem diz uma personagem, “coisas acontecem de vez em quando”. E, assim como os residentes da cidade, o público pode achar difícil se lembrar desta aventura com clareza, não por um efeito sobrenatural, mas por sua natureza inescapavelmente repetitiva.










